quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

As dúvidas do novo aviso prévio

A lei que amplia o mecanismo para até 90 dias tem o objetivo de reduzir o número de demissões sem justa causa. Mas as lacunas no texto dão margem a interpretações distintas e o questionamento pode acabar nos tribunais

por Thiago Cid
Editora GloboNo Brasil, o índice médio de rotatividade nos empregos oscila na faixa dos 40% há pelo menos 15 anos. Isso significa que, anualmente, 40% dos trabalhadores são substituídos em seus postos de trabalho. É um índice considerado alto. Para tentar mudar esse quadro, a presidente Dilma Rousseff sancionou em outubro a Lei 12.506, que estabeleceu o aviso prévio proporcional ao tempo de trabalho. Com a nova regra, o período pode chegar a 90 dias, dependendo do caso.

A Constituição de 1988 já previa o critério, mas ele só foi regulamentado pelo Congresso neste ano. A lei determina que o período de 30 dias do aviso prévio seja acrescido de três dias por ano trabalhado. “A intenção é fazer com que a demissão seja algo caro para o empregador e o induza a manter o contrato com seus funcionários”, afirma o advogado trabalhista Livio Enescu, conselheiro da seccional São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A dificuldade é que o texto da lei é curto e deixa margem para dúvidas e interpretações antagônicas. Diz o único parágrafo que: “Ao aviso prévio previsto neste artigo serão acrescidos 3 (três) dias por ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfazendo um total de até 90 (noventa) dias”.

Para alguns juristas, como o professor Paulo Sérgio João, da PUC-SP e da FGV, o entendimento é de que os três dias geram um pagamento extra por ano trabalhado. Mas não significa, na sua avaliação, que o empregado terá de trabalhar outros dias além dos 30 já previstos no artigo 7 da Constituição Federal, que primeiro tratou do tema.

A lei não prevê outras situações peculiares, como: a regra vale tanto para empregadores quanto para empregados? Esses casos devem ser julgados pelos tribunais com base no entendimento dos magistrados, o que pode estimular processos trabalhistas. Já há uma pequena jurisprudência sobre alguns pontos, mas as dúvidas só irão desaparecer à medida que novos casos forem julgados. “Seria importante se a lei ganhasse um adendo para não propiciar muito debate e acúmulo de processos nos tribunais”, diz Enescu, da OAB.

A nova lei ainda deve receber uma regulamentação, com a definição de detalhes como o momento para início da contagem dos três dias adicionais e o cálculo, nos casos em que o funcionário pede demissão. Enquanto isso não acontece, a orientação dos juristas consultados é apenas de atenção. Confira no quadro ao lado as questões ainda em aberto e os pontos já definidos.




MAIS PERGUNTAS DO QUE RESPOSTAS
OS PONTOS EM QUE AINDA NÃO HÁ CONSENSO:
> Os três dias serão acrescidos após o primeiro ano de trabalho ou apenas depois do segundo?

> Os três dias serão adicionados após um ano completo ou pode haver contagem proporcional, como o acréscimo de um dia a cada quadrimestre completo?

> As exigências da nova lei valem para empregados e empregadores ou apenas para os empregadores? Como ficam os casos em que o funcionário pede demissão?

> Os dias acrescidos no período de aviso prévio devem ser considerados para os cálculos dos demais direitos, como férias, 13º salário e FGTS?

> Caso o trabalhador tenha tirado licença médica, esse período será contado como tempo trabalhado para efeito do aviso prévio?

O QUE ESTÁ DEFINIDO
> Trabalhadores que já haviam recebido aviso prévio na data da publicação da lei terão direito à proporcionalidade?
Não. A lei vale apenas para os casos ocorridos após sua publicação.

> Se quiser desligar um funcionário imediatamente e ele tiver mais de 30 dias de aviso, o empregador terá de pagar pelos dias adicionais?
Sim. Se o empregador não quiser manter o funcionário por mais tempo na empresa, terá de pagar por isso — é o chamado aviso prévio indenizado. Com a nova lei, essa quantia deve ser acrescida do valor dos três dias referentes a cada ano trabalhado.

> Caso peça demissão e não queira cumprir o aviso prévio, o empregado pode ter mais dias descontados, além dos 30 já previstos hoje?
Não. Segundo o artigo 477 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), qualquer compensação a ser paga pelo trabalhador não pode ser maior que o equivalente a um mês de seu salário.

> Funcionários com menos de um ano de casa têm menos do que 30 dias de aviso prévio?
Não. Os 30 dias estão assegurados a todos os trabalhadores com prazo de contrato indeterminado, independentemente do período em que trabalharam na empresa.

> O funcionário em aviso prévio continua tendo duas horas diárias, ou sete dias de ausência, para procurar um novo emprego?
Sim. O artigo 488 da CLT, que regula esse assunto, não foi alterado.

> A ampliação do prazo para até 90 dias pode ser retroativa a 1988?
Não. Apesar de algumas associações de trabalhadores reivindicarem o direito, dois argumentos devem restringi-lo. O primeiro é o do ato jurídico perfeito, que diz respeito às decisões já tomadas e que estão em harmonia com a lei vigente no tempo em que foram impostas. O outro se refere à prescrição do direito trabalhista, que estipula o prazo de dois anos, a partir do desligamento, para o empregado reivindicar seus direitos.
> Para a base de cálculo, o que vale: a data em que foi comunicada a demissão, ou o dia em que o funcionário deixa de trabalhar?
A data em que o desligamento foi comunicado. 

Nenhum comentário: