quinta-feira, 28 de abril de 2011

Avanços da agricultura familiar na organização da cadeia do leite no planalto norte catarinense

Ana Lúcia Hanisch
Engª Agrônoma , M.Sc. pesquisadora da Epagri


Um grande avanço na organização das famílias produtoras de leite está acontecendo no Planalto Norte de SC a partir da formação de Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar. Este avanço é fruto do esforço de técnicos, lideranças regionais e locais, pesquisadores e principalmente, das famílias de agricultores que tem buscado estratégias de fortalecimento para esta cadeia produtiva tão importante para a agricultura familiar. Sua existência se deve a um processo de mais de seis anos de amadurecimento na região e que a partir de 2009 iniciou uma nova fase de atuação, com o trabalho em forma de cooperativas da agricultura familiar.

Nesse processo, um marco foi o intercâmbio realizado em junho de 2009 que levou famílias de produtores de leite dos municípios de Major Vieira, Monte Castelo, Porto União e Papanduva para conhecerem as experiências de organização no Oeste de Santa Catarina e Sudoeste do Paraná (Ascooper e Sisclaf). Esse intercâmbio somado aos anos de discussão e ao apoio do Programa de Territórios do MDA motivou famílias desses quatro municípios a optarem pela formação de cooperativas de leite como estratégia de organização. Com o conhecimento da realidade de outros agricultores familiares organizados, as famílias avançaram na discussão com seus grupos organizados e os formalizaram em cooperativas.

Foram formadas quatro cooperativas municipais: CLAFPorto – Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar de Porto União; CAFLEMAV – Cooperativa da Agricultura Familiar de Leite de Major Vieira; COOPERLEITE – Cooperativa de Produtores de Leite de Monte Castelo. Essas três se uniram à já existente COAFAPA – Cooperativa da Agricultura Familiar de Papanduva.

Com a criação das cooperativas foi criado também um Sistema Central das Cooperativas do Leite, ainda em 2009, com a função de apoiar as ações de gestão, administração e capacitação das cooperativas em seus municípios, trabalhar na manutenção dos princípios cooperativistas e representar as mesmas junto aos processos territoriais. A partir desse Sistema, os cooperados discutem problemas e soluções conjuntas, participam de projetos e estudam estratégias de fortalecimento. Entre esses problemas, a coleta do leite aparecia como um empecilho nas negociações com as empresas. Dessa forma, as cooperativas elaboraram um projeto conjunto de solicitação de caminhões e tanques de coleta, e solicitaram junto ao Programa do Território da Cidadania em 2009, com apoio das prefeituras municipais e a organização mostrou a sua força e o projeto foi aprovado.

Mas, para se chegar a um processo de organização como esse, que seja protagonizado especialmente por agricultores familiares é muito importante um período de formação. E essa formação normalmente se inicia a partir do processo de produção.

Em geral, a primeira reclamação dos produtores de leite, em qualquer evento de formação é a questão do preço recebido pelo litro de leite. Neste momento, é importante que os produtores entendam que nesta questão, existem dois pontos fundamentais a serem trabalhados:

1. O preço recebido por litro de leite está muito associado à qualidade e quantidade do leite produzido, que por sua vez está intimamente ligado à forma como esse leite é produzido: qual o tipo e o custo da alimentação das vacas? Qual o manejo das pastagens? Qual o planejamento da propriedade?

2. O preço do leite recebido pelos produtores está muito associado à forma de organização (ou falta dela) a que o agricultor pertence.

Sem dúvida alguma, uma família que produz leite e que planeja seu sistema de produção está muito à frente dos outros produtores e normalmente recebe preços melhores. É o que chamamos de profissionalização da produção. Importante destacar que isso não tem, em hipótese alguma, relação direta com o tamanho da propriedade ou volume de produção. A lógica está em dois pontos: 1º- quem planeja sabe (ou estima) qual a produção mensal e a alimentação mensal do rebanho. 2º - quem planeja, se antecipa em relação à produção de pasto e outros alimentos. Além disso, famílias que planejam a atividade tendem a crescer na quantidade de produção.

No entanto, planejamento de propriedade leiteira é uma atividade complexa. Para isso se faz necessário muita capacitação e acompanhamento técnico. Por outro lado, sabemos que formação e acompanhamento técnico são praticamente impossíveis de serem conseguidos individualmente. E aí entramos na segunda questão fundamental para melhoria do preço do leite: a organização dos produtores.

Dessa forma, a organização dos produtores de leite em forma de grupos, associações ou cooperativas tem sido uma estratégia fundamental para viabilizar e até mesmo exigir acompanhamento técnico dos órgãos competentes, bem como é uma excelente estratégia de negociação de preços, já que a questão da quantidade fica mais bem resolvida.

Neste sentido, a organização dos produtores de leite em cooperativas no Planalto Norte Catarinense, tem procurado agir em duas frentes, a partir da porteira da propriedade.

Essa é a base da idéia da formação de cooperativas de leite da agricultura familiar. Nos municípios de Major Vieira, Porto União, Monte Castelo e Papanduva, essa idéia já foi compreendida por grupos de famílias que vinham desenvolvendo ações em conjunto e hoje estão muito mais animados para melhorar a atividade leiteira na propriedade e no município.

Isso é bom para as famílias, para as empresas, para o município, para o técnico que dá assistência aos grupos, para quem vende ou compra produtos. É uma idéia simples, que traz muitos resultados positivos.

No Planalto Norte Catarinense ainda há muito a avançar, mas para isso é preciso formação, disciplina, fortalecimento das parcerias. O importante é que a organização da cadeia leite já mudou muito o cenário dessa cadeia e a visão das famílias produtoras, das políticas públicas e da relação dos produtores com a sociedade. Hoje é visível o orgulho e o comprometimento de todos os envolvidos. E esse é o grande mérito da organização.


Nenhum comentário: